Foto: Ana Luiza Sousa
O senador Angelo Coronel (PSD-BA) subiu à tribuna do Senado e fez duras críticas ao governo federal em discurso nesta 4ª feira, 22. Leia a íntegra abaixo ou assista ao discurso completo.
“Com cinco meses de mandato, nos parece bem clara a estratégia do Governo do presidente Jair Bolsonaro.
Aliás, a única estratégia até aqui.
Dividir o país, provocar a cizânia e a discórdia é notoriamente seu real objetivo.
Desde sua posse, o presidente mostra que ainda não desceu do palanque.
Mostra-se ainda como o candidato dos grupos de zap que o elegeram espalhando notícias duvidosas entre milhões de brasileiros.
Com a manutenção do seu discurso de ódio, parece achar que só governa para os que o levaram ao Planalto, esquecendo que quem lhe faz oposição é tão cidadão quando quem lhe dá apoio cego e incondicional.
Ao chamar de inocentes úteis integrantes de uma manifestação legítima em defesa da educação, a maior riqueza que um país pode ter, o presidente comprova mais uma vez seu caráter antidemocrático, sua inabilidade em conviver com a opinião divergente.
A inclinação para o totalitarismo do atual governo precisa acender a luz vermelha de todos nós aqui nessa casa, porque igualmente nítido em sua estratégia de divisão é jogar a população brasileira contra o Congresso Nacional.
Esta casa e nossa vizinha Câmara dos Deputados não são perfeitas, são formadas por mulheres e homens sujeitos a falhas, mas que, igualmente ao Presidente da República, foram eleitos pelo povo e só por isso já merecem respeito.
Fomos eleitos pelo povo justamente para que o povo tenha voz nas decisões da vida nacional, para que os destinos da Pátria não fiquem sujeitos apenas às vontades, aos mandos e desmandos de um único poder, de uma única pessoa.
O que parece querer o Presidente quando compartilha mensagens chamando de ingovernável o país “se não houver conchavos”?
Faço coro com meus pares e igualmente peço que o Presidente da República aponte, nominalmente, quem aqui quer conchavos ou barganha.
Em nossa visão, parece querer jogar na lama o Congresso Nacional para que a população incauta concorde que ele deve ser o único a ditar o que precisa e para onde deve ir essa nação.
Parece querer jogar para a torcida, igual em seus tempos de parlamentar, quando o que fazia e dizia não tinha consequência, quando se divertia lançando gasolina na fogueira, prática que não cabe a um Presidente da República.
O presidente precisa se dar conta de que uma coisa é ser torcida, vaiar, xingar.
Outra coisa é estar em campo no jogo da política, e estar em campo nesse jogo é sim conversar, dialogar com o Parlamento, saber quais as necessidades dos representantes do povo e dos estados.
Isso não é conchavo!
Isso é democracia!
Como disse recentemente na Folha de São Paulo o jornalista Jânio de Freitas, não existe país ingovernável.
O que existe é governo ruim, governo que não governa, que não tem projeto de país, que no lugar de se preocupar com a saúde, com a educação, está batendo cabeça, editando e suspendendo decreto, para saber quem pode ou não pode usar fuzil.
No lugar de armar a população, provavelmente é muito mais importante vigiar nossas fronteiras.
São 17 mil quilômetros, com dez países, por onde entram drogas não fabricadas no Brasil, ou pelo menos não em larga escala, e que são a grande mazela da criminalidade que destrói nossos jovens, seja pelo vício, seja pela morte nas mãos do tráfico ou a serviço dele.
Nesta 5ª feira, estaremos no Mato Grosso do Sul, a convite do Exército, visitando um pouco do Sisfron, o Sistema de Vigilância de Fronteiras, que está em atividade há muitos anos.
É um sistema de vigilância eficiente, mas que para funcionar precisa atuar na imensa extensão de nossas fronteiras, que dista 17 quilômetros.
É culpa do Congresso se decretos são criados e suspensos enquanto pelas nossas fronteiras entra o que se quer e bem entende?
Que tal investirmos na vigilância das nossas fronteiras?
O cidadão armado não vai combater o tráfico de drogas!
É um governo que toca o samba de uma nota só chamada Reforma da Previdência, tentando nos impor a falácia de que se ela for aprovada do jeito que ele quer, no dia seguinte o Brasil será uma superpotência, e que se o Congresso mexer na proposta, justamente para que os mais pobres, o homem do campo e os idosos carentes não paguem toda a conta, vai dar tudo errado.
E vai dar errado sim se acharmos que só mudar a Previdência vai resolver.
Outra reforma, a Tributária, é tão ou mais importante do que se mexer nas aposentadorias e o governo não fala nisso, e como o presidente finge que não é com ele, o Parlamento precisa agir, tocar por sua conta uma reforma que desafogue o empresário sufocado pelos impostos e o consumidor que paga mais caro no mercado por causa de tanta taxa e sobretaxa.
Inclusive, estamos com a nossa assessoria estudando para dar entrada, provavelmente na próxima semana, em uma reforma tributária efetiva onde vamos reduzir a alíquota do IR das pessoas físicas. Vamos tentar reduzir os impostos das pessoas jurídicas. Hoje uma empresa com 3 sócios, o governo também é sócio majoritário. O governo não produz, mas o governo quer receber a maior parte do lucro das empresas.
O Presidente parece querer jogar para cima de deputados e de nós senadores a culpa pelas coisas que não andam, pelos avanços prometidos e que não apareceram, ao mesmo tempo que posa de vítima de uma suposta negociata pela qual ele não aponta responsáveis e só espalha mal-estar pelo país.
Nos parece que o que se quer fazer acreditar é que quando a coisa é boa ela vem do Palácio do Planalto.
Quando é ruim, a culpa é do Congresso.
Será que é culpa do Congresso o tanto de bate boca e até xingamentos a que assistimos praticamente todos os dias pelo twitter entre apoiadores, integrantes e os chamados mentores desse governo?
É culpa do Congresso se o presidente de manhã diz uma coisa, de tarde outra, à noite uma terceira e no dia seguinte volta a dizer o que havia dito inicialmente?
É culpa do Congresso se nas últimas doze semanas o índice de confiança em relação ao crescimento do Produto Interno Bruto, ou seja, da própria economia, caiu doze vezes seguida? Isso não é culpa do Congresso Nacional
É culpa do Congresso se um dos dois principais ministros do Governo, e responsável por reerguer a economia, afugenta investidores ao dizer, em alto e bom som, aqui mesmo em nossa Comissão Mista, que nossa economia está no fundo do poço? Falar que o Brasil está num abismo? Isso sim que é afugentar investidores.
A bem da verdade, senhoras e senhores, esse tanto de bate e boca, essa clara tentativa de fazer com que o povo pense que nós, parlamentares, somos uma espécie de banda podre, nos parece também a estratégia de ofuscar a realidade de que a economia do país não desatola e não consegue gerar trabalho para mais de 13 milhões de desempregados e não consegue políticas para inserir os jovens no mercado de trabalho.
Até aqui, no lugar da promessa de se produzir crescimento, o que se produziu foi espuma, muita espuma para encobrir o vazio de ações, a estagnação de instituições como o MEC e até mesmo um retrocesso civilizatório do Brasil, apontado, não sem razão, por analistas estrangeiros.
Convoca-se para domingo próximo uma manifestação teoricamente a favor do Presidente da República, democraticamente eleito.
Alguns que a convocam pedem fechamento do Congresso e do STF, outro pilar da democracia e do estado de direito.
De onde vem esse mote totalitário, ditatorial?
Será que é manifestação genuína do povo desempregado, que está pagando quase 5 reais no litro da gasolina e sofrendo as consequências do dólar nas alturas?
Ou será que é insuflada por aqueles que não gostam do diálogo porque acham que a melhor forma de governar é fazer valer a sua vontade?
Abro um parêntese para lembrar a nossa Constituição, principal instrumento de que dispomos: se o mais alto governante da nação estiver por trás de tentativa de impedir ou intimidar os poderes, estará cometendo crime de responsabilidade, e a história recente bem aí nos faz lembrar o resultado de um crime de responsabilidade.
Cheguei a esta casa adotando postura de neutralidade em relação ao Executivo e a favor do Brasil: o que for bom, aprovarei – o que não for bom para o Brasil não terá meu voto.
Mas não há como ser neutro quando alguns posam de missionários e redentores da pátria, querendo jogar para cima do Parlamento, a casa das discussões democráticas, a responsabilidade por um possível fracasso do país, fracasso que na verdade nada mais será do que resultado de uma extrema incapacidade de governar.
Convoco o Congresso Nacional para que a gente se una para mostrar com altivez que essa Casa representa os estados, que a Câmara representa o povo, e não podemos deixar um missionário querer abalar a moral do Congresso Nacional”.